Sim, o seu filho pode chegar longe mas tem de se esforçar para isso. Veja o que é o protagonismo e como estimulá-lo nas crianças
O seu filho é inteligente? A chance de a sua resposta ser “sim” é imensa. E, possivelmente, você tem razão: crianças e adolescentes costumam ser inteligentes. A má notícia, porém, é que isso não significa muita coisa. Foi a essa conclusão que chegou Carol Dweck, professora do departamento de psicologia da Universidade de Stanford, após anos de estudos. Em sua tese tornada livro Mindset – The New Psychology of Success, Carol defende a crença no próprio desenvolvimento como a grande chave do sucesso escolar e profissional. Ou seja, inteligência e talento, por si só, não movem montanhas. Mas serão muito bem aproveitados se somados ao esforço, à dedicação e à vontade de aprender.
“A aprendizagem é uma rotina, um trabalho processual”, lembra Luciana Barros de Almeida, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia. Portanto, não há como nascer sabendo, e é aí que entra o protagonismo. Achando que tudo na nossa vida já está pronto e decidido pelos nossos traços (inteligência ou falta dela, coordenação motora ou falta dela), pelo destino e pelos outros, fica difícil aprender e crescer. Se, por outro lado, nos sentirmos como protagonistas da nossa vida, capazes de mudar e melhorar cada vez mais, os caminhos se abrem à nossa frente.
A seguir, entenda melhor o que é protagonismo e veja como estimular essa habilidade não cognitiva, ou competência socioemocional, em seu filho.
O que é protagonismo?
É a capacidade de se enxergar como agente principal da própria vida. Quem demonstra protagonismo responsabiliza-se por suas atitudes, distingue as suas ações das dos outros e expressa iniciativa e autoconfiança. Para o desempenho escolar, essa característica é muito bem-vinda, já que o aluno “protagonista” acredita que pode aprender e se esforça para isso. Em suas publicações sobre as habilidades não cognitivas, o Instituto Ayrton Senna relaciona o protagonismo ao conceito de lócus de controle: a distinção entre situações atuais decorrentes de decisões e atitudes tomadas no passado (lócus interno) e situações provocadas pelo acaso, pela sorte ou por decisões e atitudes de terceiros (lócus externo). Em outras palavras, é a distinção entre o que vem de nós e o que vem de fora. Já o conceito de protagonismo juvenil está relacionado ao papel de cidadão do jovem e a sua capacidade de se mobilizar socialmente.
Trabalho duro vale a pena
“Não importa o que eu faça, nada dá certo” é o hino das pessoas que se vitimizam. Pois não dê esse exemplo ao seu filho, sob o risco de ele passar a vida culpando os outros por seus insucessos. Se um objetivo não é alcançado, é preciso analisar se o caminho para consegui-lo foi o adequado. Procure mostrar para o seu filho que o esforço vale a pena: conte para ele sobre as metas que você alcançou na vida, relate histórias de sucesso de terceiros e proponha atividades que demonstrem isso – se plantarmos uma árvore e cuidarmos bem dela, um dia ela dará frutos; se nos organizamos, conseguiremos ler essa coleção inteira de livros até o fim do ano; e assim por diante.
Chega de “vai bem em matemática e mal em português”
Essas tachações, como “ser bom de matemática” e “não ter talento para esportes” não ajudam em nada – e não refletem a realidade. Todos somos capazes de nos desenvolver seja lá em que disciplina for, desde que com o devido ensino (por parte de cuidadores e professores) e esforço (da nossa parte). Afinal, se não fôssemos capazes de aprender, o que seria da escola? Estimule seu filho a querer se desafiar em todas as disciplinas e a descobrir o seu interesse em todas elas, e não apenas nas que lhe parecerem mais fáceis.
Diga sim à autonomia
A autonomia está bastante relacionada ao protagonismo, já que a pessoa que consegue se virar bem sozinha ganha autoestima e independência. E como estimular a autonomia de seu filho? “Para a criança se tornar um sujeito autônomo, ela precisa aprender a cuidar de si, entender-se e só depois entender o outro. A formação da autonomia se dá pelo autoconhecimento”, explica Luciana Barros de Almeida, complementando: “A conquista da autonomia é a premissa da aprendizagem”.
Como facilitar esse caminho para o seu filho? Deixando-o agir e experimentar. “Na primeira vez em que a criança de dois anos pegar água sozinha, ela derramará muito. Aos poucos, derramará menos, até não derramar mais”, exemplifica a psicopedagoga. No caso de adolescentes, é recomendável que eles sejam responsáveis por tarefas dentro de casa – como sempre levar o prato à pia e arrumar o seu quarto- e que, vez ou outra, resolvam, eles mesmos, questões burocráticas na escola de inglês ou no judô. É sempre bom reforçar: pais que fazem tudo pelos filhos lhes prestam um desserviço.
A nota é sua
“A nota é atribuída pela escola, mas é construída pelo aluno em um determinado período”, frisa a psicopedagoga Luciana Barros de Almeida. Portanto, em vez de falar mal das provas (“isso foi pegadinha!”) e do professor (“aposto que ele nem explicou isso direito”), transmita ao seu filho a ideia de que as notas escolares obtidas em provas e trabalhos são resultado de atitudes dele, como estudar o conteúdo, prestar atenção nas aulas, participar dos trabalhos em grupo, etc. Se a criança/o adolescente acreditar que as notas são atribuídas aleatoriamente, não verá por que nem como melhorá-las.
Solução de conflitos
Errar é humano. Mas, embora saibamos disso, transformamos com frequência pequenos deslizes cometidos pelas crianças e pelos adolescentes em verdadeiros dramas. Esqueceram a porta da geladeira aberta? Erraram a data de entrega de um trabalho? Quebraram algo? É picuinha – e, às vezes, até gritaria – na certa. Pois, daqui para frente, tente fazer diferente. “Errar não é o problema. O problema é não corrigir”, reforça a psicopedagoga Luciana Barros de Almeida, que propõe um passo a passo para a solução de conflitos: 1) os pais pontuam o que a criança/o adolescente fez de errado, sem exaltação; 2) a criança/o adolescente tem o direito de relatar o seu lado na história; 3) caso tenha havido mesmo uma falha, os pais a/o ajudam a identificá-la; 4) o erro é corrigido e/ou evitado em uma próxima vez. Dessa forma, admitir o erro – e colocar-se como protagonista da situação – torna-se bem mais fácil.
Os dois lados da questão
Toda situação pode ser interpretada de duas ou várias formas diferentes. E, acredite: isso vale, inclusive, para as reclamações do seu filho. Os pais, em geral, têm dificuldade de enxergar o real papel da criança ou do adolescente em um conflito. “A tendência é achar que o filho foi a vítima”, constata a psicopedagoga Luciana Barros de Almeida. “É um exercício de reflexão levar os dois lados em conta”, completa. Sem desmerecer a dor ou a revolta do seu filho, leve-o a pensar no outro lado, por exemplo: será que o seu colega empurrou você de propósito, ou apenas se desequilibrou? Será que o professor não achou que você estava falando alto demais, por isso pediu silêncio? Com esse exercício cotidiano, aos poucos aprendemos a levar o ponto de vista do outro em consideração, desenvolvendo, assim, o senso de justiça e a noção de que nós, também, podemos incomodar outras pessoas.
Texto: Cynthia Costa
Fonte: Educar para crescer